Quinta-feira, 19 de Setembro de 2024

ARTIGOS Terça-feira, 17 de Setembro de 2024, 14:13 - A | A

Terça-feira, 17 de Setembro de 2024, 14h:13 - A | A

Haroldo de Moraes Júnior

Controle Externo Popular

A administração pública brasileira é regida por diversos princípios, notadamente aqueles estabelecidos no artigo 37, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil.
Mas além dos princípios inerentes à própria administração pública, há meios de fiscalização/controle que são exercidos pela própria administração pública que perpetra o ato administrativo (chamado controle interno), como também pelo ente responsável pela fiscalização que, no caso, é o poder legislativo (controle esse chamado de controle externo).
Mas a nossa Constituição da República trouxe um outro tipo de controle, aquele estabelecido no parágrafo segundo do artigo 74, o chamado Controle Externo Popular, ou Controle Externo Social.


Esse Controle Social vem ao encontro à concepção de cidadania trazida pela própria Constituição da República que, passados mais de trinta anos da sua promulgação, nós ainda nos encontramos diante do processo de construção de uma cidadania mais participativa.
A tomada de consciência de nossos direitos e a efetivação de deveres implicam, efetivamente, no exercício dos direitos civis, políticos e sócio-econômicos, como também na participação e contribuição para o bem-estar da sociedade em geral.

 
A nossa Constituição da República dotou o cidadão brasileiro do direito/dever de fiscalizar os atos da administração pública, bem como de mecanismo que visa o exercício desse direito/dever.

 
O cidadão deve, no exercício do Controle Externo Popular, acompanhar as ações dos representantes eleitos (gestores e legisladores), no trato da coisa pública e, o mais importante; participar e contribuir para o bem-estar da sociedade. Entretanto, pouco ou nada se vê do exercício de tais direitos.


O Cidadão pouco exerce esse seu direito, tendo em vista que poucos têm conhecimento, por exemplo, que o Prefeito de sua cidade é obrigado a deixar à disposição de todos, num prazo de 60 (sessenta) dias, a contar do fim do exercício financeiro (31/12), o balanço geral para consulta pública.


Outro exemplo comum dessa falta de iniciativa do exercício do Controle Externo Popular são as audiências públicas que são convocadas, via de regar pelo Poder legislativo e pouca é a participação da sociedade.


Todo o cidadão possui o direito a participar nos assuntos públicos. A ele (cidadão), como legítimo detentor do poder soberano do Estado, deve ser respeitado seu direito em participar das decisões de todas as esferas, seja opinando para a definição das políticas públicas a serem implementadas, seja fiscalizando a ação voltada à efetivação de tais políticas.


Reconhece-se neste ponto, de fato, de que a esfera pública não diz respeito tão somente ao Estado, mas sim a todos que dele fazem parte. A noção da coisa pública no Estado Liberal e no Estado Social ou do Bem-Estar-Social, que remete à noção de tudo que diga respeito à esfera do estado, não mais pode ser aceita no paradigma do Estado Democrático de Direito. Pelo contrário, deve ser compreendida como aglomerado de todos, cidadãos e poderes constituídos.


Deste modo, de um lado, estarão os cidadãos participando da vida social e realizando a sua cota-parte de responsabilidade na efetivação das boas práticas da gestão pública e, de outro, as instituições desenvolvendo mecanismos hábeis para cumprir sua missão institucional, comparecer com as demandas sociais e fomentar o controle social e a consciência cidadã, até porque, nos dizeres de Garcia de Enterria, “(...) o cidadão não é simples destinatário da ação administrativa, não é um simples instrumento do poder, está na origem do poder”.


Neste diapasão, podemos asseverar que o povo não é apenas um referencial quantitativo que se manifesta no dia da eleição; na verdade, é um fluxo comunicativo despersonalizado que se faz presente de forma legitimadora no processo democrático de governo. A característica que, notadamente, coloca a pessoa na condição de cidadão é o gozo dos direitos políticos.

 
Neste sentido, por direitos políticos, entende-se não só a capacidade de votar e ser votado (na habitual distinção entre cidadania ativa e cidadania passiva, respectivamente), mas também a de participação nos diversos segmentos de formação das decisões políticas e de controle da atuação dos governantes.


Assim, além do Controle que nós podemos chamar de Institucional, aquele exercido não apenas pelo Poder Legislativo, mas pelos Tribunais de Contas e Controladorias, ou seja, que um Poder ou Órgão exerce sobre o outro, existe o Controle Externo Popular ou Social, que pode ser entendido como uma forma de fiscalização e controle por parte da própria sociedade sobre as ações do Estado.

 
Ao permitir que os próprios cidadãos participem de alguma forma da gestão da coisa pública, o Controle Social propicia a vivência da própria Democracia, pois, ao praticar esse controle, os cidadãos podem interferir no planejamento, na realização e na avaliação das atividades do governo.

 
Deste modo, o Controle Social pode ser entendido como a participação do cidadão na gestão pública: fiscalização, monitoramento e controle das ações da Administração Pública.
O Controle Externo Popular é um importante mecanismo de fortalecimento da cidadania que contribui para aproximar a sociedade do Estado, abrindo a oportunidade de os cidadãos acompanharem as ações dos governos e cobrarem uma boa gestão pública.
Entretanto, há de se perquirir quais os fatores que impedem a participação popular e o controle social?


Acredita-se que um dos fatores é o Clientelismo Político. Ao privilegiar alguns atores sociais em detrimento de outros na administração pública. Tem-se ainda o Assistencialismo ou Paternalismo.

 
Por fim, e que reputo como sendo o mais grave, tem-se ainda falta de Cultura Participativa e Fiscalizatória. A falta de participação e a apatia política da sociedade cria, sem dúvida alguma, maiores facilidade para a corrupção política e desvio de verbas públicas. Para o gestor mal-intencionado, que já entra na política com interesses particulares e partidários, quanto menos participação do cidadão no controle das contas públicas, melhor.


Fazer com que os cidadãos possam participar diretamente desse processo de construção de uma sociedade mais democrática não é uma tarefa fácil, mas é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

 
Quando ministrávamos aula na Graduação e Pós-Graduação no Curso de Gestão do Serviço Público, dávamos como exemplo a participação dos cidadãos norte-americanos na solução de algum problema que as cidades enfrentavam, sobretudo as pequenas cidades.
O senso e a consciência de cidadania que o norte-americano possui é de dar inveja a todo e qualquer brasileiro.


Acho que a falta de consciência de cidadania e, por conseguinte, a ausência de Controle Social é cultural e é fomentado pelos governantes que não querem que o cidadão exerce esse direito que lhe assiste.


O Controle Externo Popular ou Social, ainda encontra-se engatinhando, pois, a participação da sociedade está muito incipiente, notadamente, pela falta de incentivo dos nossos governantes.
A sociedade tem que impor e fazer jus ao seu papel de mandatária dos Governantes e, por conseguinte, das Políticas Públicas e dos destinos da aplicação do erário. A fiscalização da qualidade de nossas escolas, da qualidade da merenda escolar, dos transportes escolares é um bom começo, devendo ser exercida, sobretudo, pelos próprios pais dos alunos.


A partir que o Cidadão obtiver consciência de seu papel na construção do Estado Democrático de Direito, a fiscalização e o controle sobre a Administração Pública em geral irão mudar sensivelmente, passando estes a exercer com compromisso o seu múnus público que é o de bem servir a sociedade.


Enquanto os agentes políticos eleitos não forem cobrados por seus eleitores, pelo cidadão, estes farão o que bem entenderem, sem se preocuparem com o que pensa a sociedade.

 

Haroldo de Moraes Júnior
Advogado e Técnico de Controle Público Externo do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso.