Regina Santana da Silva Fernandes, de 41 anos, está totalmente abalada após ser alvo de preconceito em empresa onde trabalhava. A informação é de amigos e familiares que apontam que o desequilíbrio emocional veio logo após o constrangimento imposto a ela pela sua supervisora. E, claro, a demissão, após chegar ao trabalho de 'cabeça raspada', fruto do ritual de iniciação no Candomblé, que comumente ocorre como tradição na religião de Matriz Africana.
Regina agora passará por avaliação psiquiátrica para tratar de depressão, por conta da situação de intolerância religiosa, do claro preconceito de raça e cor que culminou na perda de seu emprego. Contudo, não consegue, por ora, discutir a situação, após ser alvo do preconceito.
Tabalhando em um serviço terceirizado de limpeza para empresa Morhena, em Cuiabá, desde junho de 2019, Regina foi constrangida pelo fato de ter raspado a cabeça. Ela teria voltado a trabalhar no dia 8 de setembro, já com receio de sofrer algum tipo de discriminação. Chegando mesmo a usar seis tocas na cabeça para disfarçar que estava sem cabelo.
Ela foi iniciada no Ilê Axé Egbé Osogbo Omo Orisá Osun, que significa Sociedade Espiritual dos filhos da Orixá Oxum, uma casa de Candomblé inaugurada há um ano em Várzea Grande.
O ritual de iniciação é tradição na religião de Matriz Africana. Assim, a raspagem do cabelo é um dos sinais que os iniciados do Candomblé apresentam ao ingressarem na religião e simboliza a consagração aos Orixás. O ato também é comum em religiões como o Budismo e em algumas ordens religiosas cristãs, com simbolismo parecido.
Entenda o caso
Um dia depois que voltou a trabalhar, Regina foi ao banheiro, e sem perceber foi vista pela sua supervisora, que a viu sem toca e a questionou o porquê ela estava com a cabeça raspada. Ao indagar a funcionária, a responsável pelo setor chegou a perguntar se a colaboradora estava com câncer.
Regina respondeu que não estava doente, e em seguida, sua supervisora exclamou: "entendi" e, saiu do local indo direto para o escritório.
Depois do ocorrido, conforme é narrado em boletim de ocorrência registrado nesta terça-feira (22), na 1ª Delegacia de Polícia de Cuiabá, Regina foi chamada ao escritório no dia 17 deste mês, nove dias depois que tinha ocorrido a situação no banheiro.
Ao ser recebida no escritório da empresa – onde teve que esperar por 2h30 para ser atendida - Regina foi obrigada a tirar a toca da cabeça sob ordem da gerente. Com um olhar de reprovação a gerente disse que esse tipo de religião não cabia na empresa, pois além de ser "negra era macumbeira".
O constrangimento ainda continuou e a gerente afirmou que Regina tinha que "procurar Deus para se salvar" e ainda que pessoa da cor dela “e macumbeira não pode participar do quadro de funcionários da empresa”.
A gerente ainda intimidou Regina afirmando que nem adiantaria ela procurar pela Justiça, porque não daria em nada já que "a empresa possui vários processos e nunca perderam".
Regina foi obrigada ainda a assinar um aviso prévio que já estava com data de 11 de setembro, ou seja, seis dias antes da data que foi comunicada que seria demitida.
Posição da Iyalorixá
A Iyalorixá Edna de Oxum, que é zeladora espiritual de Regina e presidente do Ilê Axé afirma que está indignada com a situação e, que a situação não será colocada no esquecimento.
"Estamos vivendo tempos difíceis de ataques às aos praticantes das religiões de Matriz Africana e de desrespeito ao nosso sagrado. Nós não vamos deixar essa situação impune. Já temos uma advogada cuidando do caso e queremos a reparação na Justiça de todas as ofensas e crimes praticados contra minha filha de santo".
Mãe Edna, como é conhecida a sacerdotisa, enfatiza que os adeptos das religiões Afro, como Candomblé e Umbanda, não podem se calar diante da situação de racismo religioso e preconceito, e que a denúncia às autoridades competentes e a busca pelo Poder Judiciário é fundamental para que esses casos não se transformem apenas em estatística.
"Eu fiquei sabendo dessa situação já alguns dias depois do ocorrido. E minha atitude quando soube não poderia ter sido diferente. Imediatamente busquei por uma advogada e registramos o BO para garantir que este caso não seja mais um, e sim, que a Justiça seja feita".
O outro lado
A assessoria da Empresa Morena de Parceria e Serviço, com matriz em Campo Grande, Mato Grosso do Sul [cujo nome da empresa em Cuiabá, MT, consta com o nome fantasia de Morhena] informou ao site O Bom da Notícia que somente deverá se manifestar na Justiça, já que a funcionária Regina Santana da Silva Fernandes fez Boletim de Ocorrência, sob uma narrativa de preconceito da empresa quanto ao fato dela ter 'raspado a cabeça'. "Assim, estamos aguardando sermos intimados e a situação já está nas mãos do nosso jurídico".
Veja o Boletim de Ocorrência