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AGRO & ECONOMIA Terça-feira, 14 de Fevereiro de 2023, 14:25 - A | A

Terça-feira, 14 de Fevereiro de 2023, 14h:25 - A | A

URBANISMO

Condomínios levam infraestrutura a vazios urbanos

Da Redação do O Bom da Notícia/Com Assessoria

Organismo vivo, a cidade cresce em diferentes vetores, desdobrada em novos bairros e condomínios, mas em inúmeros casos, deixando para trás vazios urbanos que custam caro às políticas públicas e à rotina da população. O Urbanismo dá sua contribuição ao ordenamento das relações entre crescimento urbano, demanda pública por infraestrutura e investimentos privados. Natália Magri, coordenadora técnica do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (CAU-MT), destaca a importância do Urbanismo para o pensar mais estruturado das cidades e dos que vivem nela, incluindo regiões como o Bela Marina e Jardim Imperial, onde novos condomínios estão sendo construídos, mudando o desenho urbano da comunidade.

Confira a entrevista completa.

Qual é o papel do urbanismo? Para que ele serve na vida das pessoas?
Na Arquitetura, nunca se pode esquecer que mesmo a sua casa, isolada, num lote, está dentro de um contexto urbano e coletivo. O Urbanismo serve para tentar organizar minimamente o espaço urbano. É um estudo dessa organização espacial da cidade, de como ela se desenvolve e quais são os focos de induções e desenvolvimento econômico. É uma área complexa porque tem essas várias nuances – não só técnicas, mas também sociais.

Quando olhamos a concepção de um condomínio fechado, esse tipo de empreendimento congrega Arquitetura e Urbanismo em sintonia fina, correto?
Sim, porque haverá ali os dois mundos: um mini espaço urbano, com áreas coletivas, que vai servir a um grupo de pessoas, e que está dentro de um contexto urbano também. Um condomínio reproduz esse cenário urbano, sendo ele próprio inserido na coletividade.

Ao se observar cidades como Cuiabá, com esse forte componente histórico, antiga, e ao mesmo tempo com forte alavancagem de crescimento urbano, quais são os maiores desafios ao Urbanismo?
O componente histórico é diferenciado. Um Centro histórico antigo tem todo um desenho muito diferente de uma cidade contemporânea – e não é fácil coexistirem essas realidades. Pensar a cidade, o plano diretor, é algo recente. A cidade é um organismo vivo, que vai crescendo, se esparramando, e aí surgem vazios urbanos em meio a essa mancha. E muitas vezes o poder público só chega depois a esses locais. Ou seja, não há um planejamento antes para ordenar o crescimento e a chegada de infraestrutura de forma mais robusta. É preciso tratar esses vazios no meio da cidade – onde já há infraestrutura mais próxima instalada.

“Não é pecado construir um condomínio, isso faz parte do capitalismo. Se houver pessoas minimamente preocupadas em qual é a melhor forma de fazer isso acontecer, a cidade ganha.”

O gasto público, a rigor, poderia ser mais otimizado em transporte, saúde, em demandas públicas no geral, se houvesse esse ordenamento mais aprofundado...
Exato. Tanto que os teóricos mais recentes do Urbanismo defendem o conceito das smart cities, que entre as premissas, prega o ideal de que se trabalhe perto de onde você mora, como forma de se reduzir distâncias, para aproveitar essa infraestrutura disponível. O que demanda mais dinheiro, do ponto de vista do planejamento urbano? Asfalto, saneamento, transporte, são itens que demandam mais investimento. Por isso é muito custoso que a cidade vá se arrastando e se alongando cada vez mais. Quando se constrói em áreas onde já há determinada infraestrutura, há uma redução de recursos e impactos.

Nesse contexto, é possível afirmar que construtoras também exercem um papel de relevância social – além do óbvio interesse econômico – ao ocuparem esses vazios urbanos com a oferta de novos imóveis?
Sim, porque são áreas que já estão lá e que precisam ter um uso. Se há um bom projeto, pensado por profissionais que avaliem, por exemplo, onde será instalado um acesso ao condomínio, se em determinado ponto ou outro do bairro, causando menor impacto ao trânsito dessa comunidade, isso já é uma contribuição ao urbanismo. A coletividade precisa de bons projetos, de bons profissionais, que entendam essa dinâmica urbana. Não é pecado construir um condomínio, isso faz parte do capitalismo. Se houver pessoas minimamente preocupadas em qual é a melhor forma de fazer isso acontecer, a cidade ganha. Algo muito diferente é ir lá longe, numa área muito distante e onde não há nenhuma infraestrutura próxima, e determinado empreendedor diz: “tenho uma área aqui e quero construir”. Isso gera um custo muito maior para a cidade levar infraestrutura para lá.

Cuiabá e Várzea Grande registram diversos condomínios fechados lançados ao longo da pandemia, de diferentes portes e nichos de moradia. Como você avalia esse aquecimento do mercado?
Não vejo um cenário onde condomínios não existam. Há membros da academia que condenam esse modelo de moradia, existe essa crítica. Acredito ser uma discussão inócua, é algo cuja existência é impossível ignorar. No Brasil, há muitas pessoas que querem a experiência de morar em casa convencional, mas o fator segurança é determinante na escolha por um condomínio fechado. Isso independe de situação econômica: o desejo de se sentir seguro. Por isso, nós profissionais procuramos desmistificar esse ‘pré-conceito’ de que condomínio é para pessoas de maior poder aquisitivo. Não é.

“Quando se começa a ter espaços na cidade que ficam muito estereotipados – ‘ali é só condomínio classe x ou y’ – se começa a impor barreiras, segregações.”

Em regiões como o Jardim Imperial, pode-se observar novos empreendimentos de diferentes nichos de mercado coexistindo numa mesma área, casas do mais alto padrão, vizinhas a condomínios de apartamentos compactos. É uma tendência que veio para ficar?
Aqui no CAU, apoiamos projetos de habitação de interesse social, com unidades habitacionais mais acessíveis. A principal ambição das pessoas segue sendo a casa própria. Era o sonho dos nossos pais e o Brasil não superou isso, porque o déficit habitacional ainda é imenso. Em regiões como a que você menciona, temos um retrato da cidade, que precisa ser um espaço plural. Isso é positivo. Quando se começa a ter espaços na cidade que ficam muito estereotipados – ‘ali é só condomínio classe x ou y’ – se começa a impor barreiras, segregações.

Em outra região, no Bela Marina, a chegada de condomínios gerou polêmica entre moradores que já ocupavam a área, com poucas moradias instaladas. Como o Urbanismo encara espaços com essas características?
É um bom exemplo. Essa região, que abraça o Porto é, talvez, mais sensível que o Centro Histórico. O poder público, nos parece, não saber o que fazer com essa área. É uma região que tinha uma grande importância, muitas potencialidades e que até hoje não é contemplada com um trabalho avançado de revitalização. A iniciativa privada acaba por ocupar esse papel, criando esse movimento. Muitas vezes, precisa acontecer a chegada de determinado empreendimento, algum investidor precisa apostar em determinada área e chegar primeiro, para algo acontecer no contexto urbanístico. Isso não é uma crítica a Cuiabá ou Várzea Grande. Isso se vê, no geral, em inúmeros municípios. O Urbanismo tem muito a contribuir.